linhatravelâmina
A exposição é um jogo de encontros entre linguagens poéticas, visuais e aproximações formais que derivam de modos de fazer, empatias e interrogações das propostas artísticas dos seus autores: Maria Ribeiro, Miguel António Domingues e Daniel Mattar.
O título da exposição é, do meu ponto de vista, um reflexo desse jogo formal e relacional que procurei encontrar nas soluções e na materialização das obras de cada artista no espaço da galeria, bem como no espaço partilhado entre cada obra: uma linha, uma trave, uma lâmina – linha, trave, lâmina. Fazer um outro espaço.
· linhatravelâmina é, numa forma livre e inventada, uma aproximação a um trava-língua, mas também uma chave, não propriamente um índice, para observarmos no trabalho dos artistas as diversas relações entre estes elementos, que, aparentando pertencer apenas aos universos da geometria, da construção e do quotidiano, são também materialização da estrutura das obras, e assim objectos apropriados e integrados na criação artística.
A arquitectura da sala foi determinante no diálogo tripartido que antecedeu a exposição e convocou possibilidades diversas, assim como os encontros que são determinados por algumas obras que redefinem um novo desenho do lugar, por vezes criando intervalos, grandes planos, cenários, apontamentos, um diálogo entre obras abstractas que indiciam presenças, memórias, palavras.
Uma das obras de Maria Ribeiro é como uma linha ou uma lâmina de cobre que se desenvolve no movimento contínuo entre a parede e o encontro com o plano do chão, prolongando-se na sua extensão pelo espaço da galeria e marcando o trânsito do corpo do espectador no espaço. Os reflexos, brilhos metálicos, na sua materialidade orgânica, chamam-nos a pensar no mundo natural em contraponto com uma estrutura/trave construída em madeira.
Miguel António Domingues apresenta uma obra de assinalável dimensão, entre o desenho e a escultura. Esta obra, trabalhada em papel vegetal, pigmento e metal, intitulada Big bird cut, cria relações espaciais e visuais que surpreendem o olhar e reconfiguram a nossa percepção do espaço. É uma peça muito subtil, contrariando neste aspecto a sua escala monumental e uma outra obra do autor, também construída sobre papel vegetal, além de três lâminas de metal para serrar. Em todas as suas obras sobressai uma aura poética e teatral.
Nas peças dos três artistas observamos uma métrica rigorosa, uma atenção à medida que é constante e tem particular relevância na obra de Daniel Mattar. Uma das suas pinturas matéricas é central na sua participação na exposição. A sua forma é como um trapézio desarticulado da sua matriz geométrica, enquanto a cor e a textura são difíceis de nomear, próximas das terras e dos ocres escuros num monocromo muito singular. A inclinação da composição da grelha, tão característica desta fase do seu trabalho, parece em permanente movimento e responde à arquitectura do espaço. Algumas outras obras de dimensão mais reduzida guiam-nos a uma nova fase de trabalho, que se revela numa obra de perturbantes velaturas.
Entre a linha, a trave, a lâmina e todas as outras obras expostas, há modos de fazer, ler e partilhar as obras dos artistas, partilhar o nosso olhar e desenhar um outro espaço.
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João Silvério
Curador