A exposição 'Entre a água e a terra' reúne dois artistas que pela singularidade dos seus trabalhos, parecem percorrer trilhos paralelos, de natureza autêntica, numa procura pelo regresso à simplicidade, ao momento e à quietude. Com quietude, não quero referir acomodação ou letargia, antes plenitude e paz.
Maritza Caneca é uma fotógrafa com uma carreira construído nos plateaus de cinema e fora deles. Trabalhou como diretora de fotografia durante três décadas e o seu trabalho pessoal fugiu para uma mais conceptual procura pela plenitude que a água traz, quando a pensamos num enquadramento arquitetónico. Esse pensamento fez a artista encetar uma procura pelos espaços belos, serenos e fascinantes momentos (monumentos) arquitetónicos onde o homem constrói a harmonia com a água. A libertação que o meio aquático exerce sobre nós e o local onde essa catarse ocorre, é o corpo de trabalho de Maritza Caneca. Capta o momento onde o elemento humano já não está presente, abandonou o espaço depois de o utilizar. Fica o vazio, aparentemente frio a denunciar essa presença ou apenas a sugeri-la (o pavimento molhado ou algum objeto abandonado). Outras vezes não se consegue adivinhar se o momento já se deu ou se está apenas à espera de acontecer. Em todo este caminho, Maritza acaba não só por revelar os espaços, mas vai um pouco mais além, trazendo perante nós toda a alma, história (as), memórias e futuros.
Maritza vive atualmente entre Rio de Janeiro, Miami e Lisboa.
Daniel Mattar, é um fotografo que se tem dedicado nos últimos anos a desvendar paisagens que a nossa realidade quotidiana desconhece.
Somos, enquanto homens, vítimas de rotinas, numa constante repetição de gestos e actos, vítimas do tempos fugit que nos condiciona e molda os sentidos. Raramente somos despertados para apreciar o silencio, o movimento das marés ou outras atividades não consentâneas com as vidas agitadas e carreiras que perseguimos.
Daniel Mattar é de outro tempo. O seu trabalho serpenteia entre o real visível e o que existindo, não se vê. O real imaginário, poderia dizer.
As fotografias de Mattar surpreendem numa primeira observação. Somos levados a decifrar as paisagens. Os caminhos serão artérias de pulsante corrente sanguínea ou rios de lava quente? Mais à frente avistamos cordilheiras sem fim ou será a mais profunda fissura dos oceanos?
Tempo, momento, utopia e sonho. Pedaços de micro paisagens reveladas perante a lente, que tudo perscruta sem nada esconder.
Daniel Mattar, natural do Rio de Janeiro, vive e trabalha em Lisboa.
"Entre a Água e a Terra", que a Brisa Galeria nos mostra agora, é o encontro feliz entre dois artistas excecionais, com a faculdade de surpreender sem aviso, de levantar questões e durante todo o processo, entregar ao observador, momentos que preenchem e emocionam.
Rui Guerreiro, 2021
Curadoria e Texto: Rui Guerreiro
Montagem expositiva: Pedro Canoilas
Realização: Brisa Galeria